(por César Magalhães Borges)
Minhas experiências em viagens internacionais são poucas, diminutas, porém algumas delas são bastante recentes e renderam um bom número de reflexões.
Depois de décadas de ter sido alfabetizado em minha própria língua, tive a oportunidade de, pela primeira vez, visitar dois países da Europa.
A língua inglesa ainda é, de fato, a grande língua de intercâmbio cultural no mundo. Até mesmo a França, famosa por sua resistência ao idioma, rende-se, lentamente, ao inglês.
De trem bala e mar abaixo, segui para a Inglaterra; berço do idioma mais falado em todo o ocidente e, lá, sem qualquer pretensão de estudo científico de campo, empiricamente, pude constatar dois aspectos relevantes no que diz respeito à língua:
- o primeiro é que o inglês não pertence mais aos ingleses (especialmente aos londrinos), dada a enorme quantidade de estrangeiros que trabalham no comércio, recepcionam turistas e vendem o cartão postal de uma língua que não é a deles;
- o segundo é que, entre os falantes nativos, há os que falam bem e os que falam mal o próprio idioma (desde os aspectos gramaticais, até problemas de dicção e clareza de pronúncia).
Como turista, naturalmente, sentia-me muito mais confortável e seguro quando tinha a oportunidade de conversar com os bons falantes da língua.
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Se minha experiência em outros países é pequena, meu contato com estrangeiros vem de longa data e posso afirmar que entre americanos, mexicanos, franceses, alemães, ingleses, italianos, holandeses, canadenses, espanhóis, cazaquistaneses, nigerianos e bielorrussos que conheci, existe a plena consciência, hoje, do lugar que o Brasil ocupa no mapa e da língua falada por nós.
Aumenta, no mundo, o interesse pelo nosso idioma e isto muito se deve à imagem que o Brasil projeta para todo o planeta. Nossa arte, nossa cultura, nosso esporte, nossos ídolos estão por toda parte...
Entramos na rota dos grandes eventos e muita gente promete, em breve, vir até aqui. Mas será que estamos preparados para receber tanta atenção e um número tão grande de visitantes em nosso país?
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Em forma de interlúdio e com bastante brevidade, reconto um fato simples, mas de importância crucial:
A mãe de Paul McCartney – que faleceu quando ele ainda era adolescente –, e a tia de John Lennon – que o criou desde a mais tenra infância – fizeram questão que os meninos aprendessem a falar bem, pronunciassem bem as palavras para que, entre outras coisas, não sofressem, já ao abrir a boca, o preconceito de classe tão comum à Inglaterra daquele período.
Resultado: o inglês dos Beatles – até no que tem de mais liverpudiano – é universal.
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Eis aqui um caminho a se trilhar do início: o exercício da fala. A fala bem articulada, a fala com boa dicção, a fala compreensível, a fala calorosa, a fala amigável, a fala fluente.
O prato é feito em casa. Dentro de cada lar, entre os membros de toda família, a fala permeia e nutre a vida. Que seja rica, que seja farta!
Nas salas de aula de cada escola, que venha a boa leitura, que venha a cultura escrita, mas que haja, também, a cultura da fala, o jogo teatral, saraus, jograis: que se descubra a fala do outro.
E vivam os sotaques, os regionalismos... As diferenças são sempre bem-vindas. Não são necessários os purismos, o intelectualismo, ares esnobes ou afetação. A simplicidade pode vir carregada de beleza e correção...
Presta’tenção! ‘tô falano c’ocê!
Articulista: César Magalhães Borges é poeta, professor universitário e autor dos livros: Passagem (poemas e crônicas), de 1985, Contrastes (poemas e crônicas), de 1987, Canto Bélico (poemas), de 1994, Bolhas de Sabão (infantil), de 1998, Ciclo da Lua (poemas), de 1999, Três Acordes (infantil), de 2003 e Folhas Soltas (poesia incidental), de 2006. | |
Mediadora: Janethe Fontes é escritora, além de blogueira (nos momentos vagos), palestrante (quando possível), securitária (no dia-a-dia) e leitora viciada; é também esposa, mãe e outras coisas. Tem 3 livros publicados: Vítimas do Silêncio, Sentimento Fatal e Doce Perseguição. |
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13 comentários:
Concordo!!
Wilson
Que bom ter esse lutador e escritor de primeira,César Magalhães Borges, não necessariamente nessa ordem, atuando na minha cidade: Guarulhos. Votei nele no quesito Cultura da Revista É! que está rolando pela internet. Igualmente bom é lê-lo. Abraço!
Valdir,
Agradeço pela leitura, pela participação, por todas as suas palavras e, claro, pelo voto também! (rs)
Um grande abraço,
César
Como disse Gilberto Gil, "há tanta coisa pra gente saber" o que não se restringe a "o que dizer e ao que calar" mas também a melhor maneira de faze-lo. Quando escrevemos é mais fácil pois sempre há possibilidade se reler, rever, corrigir o texto ou prossegui-lo. Já quando falamos é necessário a naturalidade e quanto mais conhecemos a língua e maior nosso vocabulário, tanto melhor. Para sermos aceitos, para sermos aprovados numa vaga de emprego, para sermos compreendidos. Adoniram Barbosa dizia que para falar errado era preciso saber falar errado. Por mais controverso que isso possa parecer é cultura da fala também. Vamos falar mais professor! Sem correções, tá tudo aí no seu texto. Parabéns! Um abraço, Emilia
Emilia,
Em primeiro lugar, agradeço pela visita e pelo comentário.
Ao citar Adoniran Barbosa, você tocou em um ponto que, para mim, é muito caro: transgride melhor, "desconstrói" melhor quem conhece a estrutura. Picasso conseguia desconstruir, em cubos, suas figuras porque sabia desenhar muito bem. Adoniran, em toda sua simplicidade, foi um grande sábio.
Um abraço,
César
Amei o texto... isso me faz lembrar direto do túnel do tempo, C.César - 8a. série rsrs! Onde tinhamos professores maravilhosos e melhores alunos.. Sdds Professores como a dupla César e Wilton, Wagner de Biologia. Enfim época que o nosso 'portugues' era melhor 'aprendido'.
Oi, Raquel!
Fico muito feliz com seu comentário e, também, em perceber que o fórum traz, além da discussão do tema, a possibilidade do reencontro. Aquela geração do Cerqueira foi, de fato, diferenciada...
Um grande abraço e muito obrigado,
César
Olá Professor e a todos que aqui postaram
Acredito que o uso de uma língua é algo vivo e que ultrapassa as regras gramaticais.
E que o crescimento do interesse em estrangeiros aprenderem a língua portuguesa deveria nos alertar sobre a importância do ensino da mesma em todos os segmentos educacionais.
Porque infelizmente o nosso ensino defasado faz com que encaremos a nossa língua como algo diante de nossa realidade cotidiana.
E deveriamos lutar para o nome da mesma ser língua Brasileira pelo termos recortes linguísticos totalmente divergentes do que se é falado em português.
A língua é a mola propulsora da cultura de um povo.
No mais,adorei suas sábias observações da língua inglesa e suas ramificações ao redor do mundo.
Juliana Prado Uchôa
Oi, Juliana,
Creio que já havíamos caminhado mais no sentido do reconhecimento de um "Português Brasileiro" e agora, após o novo e famigerado "acordo ortográfico", parece que retrocedemos... Ainda assim, aos olhos e aos ouvidos do mundo, o nosso português é diferente do de outras paragens...
Concordo, também, com a associação que você faz entre cultura e língua. A língua é um dos elementos que constituem a identidade de um povo e esta é uma das razões pelas quais devemos senti-la e entendê-la como algo que nos pertence; é um direito e um patrimônio que deve ser tratado com zelo por todos nós.
Agradeço muitíssimo pelo comentário, Juliana!
Um abraço,
César
É sempre bom saber que ainda existem pessoas como o César Magalhães, que além de escrever de maneira tão "deliciosa" pela leveza e fluidez , também nos faça refletir sobre a importância do falar e reconhecer a língua portuguesa, hoje tão castigada por nós brasileiros. Mas como temos pessoas como você que traz esse tema para discussão, acredito que ainda podemos reverter o quadro e, zelar por nosso idioma.
Abraços
Kátia Duarte
Olá, Kátia,
Também me coloco entre os otimistas e acredito que, com trabalho e determinação, somos capazes de superar o atual quadro e restaurar a beleza de nosso idioma.
Um abraço e obrigado pelo comentário,
César
Boa Noite Professor Cesar e a todos!
Eu acho que o Brasil não está e nunca ficará preparado para os grandes eventos que estão por vir. As olimpíadas no Rio será maquiada como foi a da China. A imprensa irá esconder os problemas sociais que acontece no Rio, assaltos, assassinatos, favelas etc. Isto se o governo não colocar tapume para esconder a favela. E a Copa do mundo, irá trazer mais dinheiro e visibilidade para o governo do que para a população em si. Já começou a roubalheira fazendo estágios desnecessários em estados que não há time de grande expressão. Aeroportos extremamente precário, infraestrutura zero para um evento gigantesco como este. Quem perde é a população e a nossa língua. Este dois eventos poderosos, poderiam fortalecer nossa língua, mas para atender o público, preferem favorecer e influenciar a falar o inglês para a população, do que fortalecer, ter um incentivo maior a população a estudar e ler mais a nossa língua.
Já é difícil unificar a nossa língua por questões culturais e socioeconômicas. Culturais é questão das gírias e modo de falar das diferentes regiões e suas culturas, e socioeconômicas é por questão do ensino, as classes socais mais baixas não tem acesso à estudos de boa qualidade comparado aos que estão nas classes sociais mais altas, e por este motivo, encontra muitas pessoas falando errado, não conhecendo certas palavras. escrevendo errado. Eles não tem culpa, já que o governo não investe na educação como deveria, fazendo a escola pública ser muito fraca comparada às particulares.
Se o governo gastasse os milhões das obras da copa e das olimpíadas em educação, o índice de analfabetismo seria menor ou seria quase inexistente, a concorrência para vagas de emprego específica seria maior, consequentemente as pessoas estudariam mais para passar na frente dos concorrentes. Pessoas com formação superior tende a ter renda maior que pessoas que só tem segundo grau para baixo. Porém aqui se faz o conceito de Roma, "pão e circo" para tirar a atenção das pessoas sobre os problemas do país e dos governantes.
Quem sabe com mais pessoas letradas, estudiosas e conscientes, o país fosse mais unido, o país fosse mais rico não apenas culturalmente mas financeiramente, e no futuro, a língua portuguesa seja tão importante se não mais, que a língua inglesa.
Olá, Rafael!
Você aponta vários problemas que são reais e que merecem, sim, a nossa atenção. Os eventos que estão por vir servem para voltar o país aos olhos do mundo, mas, por outro lado, servem para evidenciar a realidade do país para os próprios brasileiros. Temos de fazer desse momento de tamanha visibilidade uma oportunidade para mostrar aos governantes que queremos um legado verdadeiro dos investimentos gigantescos que serão feitos aqui. Há coisas que precisam ser feitas para a Copa. Há coisas que precisam ser feitas para os Jogos Olímpicos. Todavia, há coisas que precisam ser feitas para a construção de uma sociedade mais desenvolvida e emancipada e, para isso, os investimentos em educação e cultura são essenciais. Não podemos desperdiçar mais tempo...
Um abraço e obrigado pelo comentário,
César
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